ABORTO DE ANENCÉFALOS – PARTE 5: Adoção de novas regras sobre o aborto.



 Nosso trabalho trata principalmente da permissão dos abortos nos casos de risco a saúde da mulher, e principalmente nos casos de gestação anencéfalo. Como já citado anteriormente no estudo do aborto sobre a óptica religiosa, existe uma corrente que defende que a vida começa com a formação do córtex neural, essa corrente tem como tese do médico e professor de Bioética Marcos de Almeida da Universidade Federal de São Paulo. Segundo divulgado na revista Época, edição já citada anteriormente, se defende que o Estado não pode defender que a vida deve ser protegida desde a concepção, pois esta idéia não resiste ao fato de que grande parte dos embriões são expulsos durante a menstruação, sem o conhecimento da mulher, essa eliminação é natural, e o defensor da tese rebate inclusive o questionamento de que este fato ocorre devido a um percurso normal da natureza, segundo a vontade de Deus, pois segundo ele a medicina constantemente faz o contrario do que a natureza manda, salvando vidas que a natureza encaminhou a morte.[1]
O professor defende que o inicio da vida não começa de forma imediata, e sim paulatinamente, contudo o feto passa a existir como pessoa quando ocorrem as conexões neurais.
Se o ordenamento jurídico brasileiro considera que a morte se dá quando ocorre a morte cerebral e, portanto seus órgãos podem ser extraídos e doados, o mesmo critério deveria ser aplicado aos embriões. E assim levantamos um questionamento, é possível alguém viver sem cérebro? A reposta somente poder ser: não.
Assim cabe lembrar que o produto da gestação anencéfala só possui vida devido ao metabolismo da mãe, que a criança, ao nascer, sobreviveria apenas alguns instantes e viria a óbito logo em seguida. A ausência de cérebro não dá a este ser nenhuma expectativa de vida. E, mesmo se afirmando que a capacidade de vida autônoma torna-se irrelevante à questão do aborto, torna-se indispensável expor a desnecessidade de uma mãe carregar em seu ventre um filho que não tenha possibilidade de ter uma vida extra-uterina, e que ela, além da dor física que terá durante nove meses de gravidez, que neste caso tornar-se-ia a menor das dores, sofrerá de forma que só uma mãe possa sofrer ao imaginar seu filho nascendo e morrendo.
A Lei 9.434 de 04 de fevereiro de 1997, que é a lei de Transplante de Órgãos, em seu art. 3º, que prevê a retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinadas a transplante, somente se e quando for diagnosticada a morte encefálica do paciente, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção de transplantes. Ora, neste caso a lei é bem clara, que quando constatada a morte encefálica é permitido a remoção de órgãos, e conseqüentemente, devido a isto, se obteria a morte biológica do paciente.
 Então, o que leva o legislador a aceitar a morte encefálica do paciente como prioridade para o transplante, e a não consenti-la no caso do feto anencéfalo?
Cabe-se ressaltar que, o Código Penal de 1940 foi publicado com costumes de décadas anteriores, e conseqüentemente não podemos esperar que tais hábitos permaneçam pétreos. Na atual conjuntura, não só na cultura como também na ciência, houve uma grande evolução, permitindo dessa forma, a indiscutível necessidade de um Anteprojeto de Reforma do Código Penal, quando que em 1992 foi criada uma Comissão para Reformulação do Código Penal,.
Como dito acima, os fatos sociais, via de regra, precedem as leis. Assim, faz-se necessário citar a decisão do ilustre desembargador Dr. Miguel Kfouri Neto, então juiz na cidade e Comarca de Londrina, que em 19 de dezembro de 1992, pela primeira vez na história do Direito Penal brasileiro, autorizou um aborto legal em feto portador de anencefalia numa gestação de 20 semanas.
Partindo deste ponto e de todo antes estudado devemos nos questionar: será que é justo obrigar uma mãe a gestar uma criança que se tem a certeza que nascerá morto? Será que podemos obrigar uma gestante a uma série de torturas psicológicas referente a uma gestação anencéfala indesejada? Será que podemos deixar na mão de magistrados sem conhecimento de causa a decisão sobre uma interrupção de uma gestação anencéfala? Será que todos os preceitos morais divulgados por personalidades, autoridades e políticos se manteriam o mesmo se estes passassem por situação semelhante? Será que os defensores da vida seguem todo o amor a vida que pregam? Será que não seria mais importante nos apegarmos as milhões de crianças vivas e nascidas que estão em total desamparo social e afetivo, muitas vezes largadas a própria sorte nas ruas e mazelas de nosso país? Será que podemos ir contra o princípio máximo de qualquer religião, o livre arbítrio? Quantos “será”, serão necessários para deixarmos o egoísmo individual e coletivo de lado e sermos empáticos o suficiente para respeitar a vontade de uma semelhante, uma mulher com totais condições de decidir seu futuro, que não deseja passar por um calvário de martírio e sofrimentos de uma gestação anencéfala?
REDAÇÃO
AFM


[1] Revista Época, Edição 465.Op. Cit., p.87.

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