O ATO DA FILOSOFIA COTIDIANA 2




Há algo mais simplista e inversamente complexo do que os devaneios de nossa mente? Nos momentos mais diversos e às vezes inoportunos nos pegamos viajando em nossos delírios sãos, em vislumbres e perspectivas quase surrealistas.
O que é isso se não o exercício da filosofia cotidiana? Como na publicação anterior desta série, postada em julho do ano passado, vivemos a filosofia diariamente, desde as coisas mais banais até grandes debates intelectuais, desde uma conversa descompromissada num boteco com os amigos, até as mais importantes conferências, ambas tem um conteúdo em comum, que é o ato de filosofar, e este movimento é importante em ambos os cenários.
Muitas vezes ignoramos a filosofia, rejeitamo-las como algo relegado a um nicho pequeno de pessoas, qual na verdade, a filosofia é vivida intensamente por todos nós, sempre, impreterivelmente, irremediavelmente, implicitamente, explicitamente, e por que não às vezes, insanamente, sendo assim, façamos novamente alguns exercícios filosóficos:
Primeiro exercício:
Existem caminhos que sempre seguimos, seja o trajeto do trabalho, da escola, da casa de alguém, ou até mesmo uma viagem que sempre fazemos. Muitas vezes andamos este trajeto de forma automática, sem repararmos todo o mundo que emoldura esta paisagem. Qual a distância que percorremos? Como se desenvolve a vida que ali acontece? Quais as pessoas que por ali trafegam? Quantos serviços, produtos, bens já usufruímos das empresas, comércios e afins deste caminho já usamos? Quando fizemos este caminho pela primeira vez, qual foi à sensação de tempo que tivemos? Bem como, qual foi nossa perspectiva sobre isso tudo? Quantos prédios foram, construídos, reconstruídos, demolidos, reformados? Quantas empresas, comércios e afins fecharam e abriram? Quantas coisas, almas, sentimentos e vidas ali já foram perdidos? Qual a imutabilidade deste horizonte? Observe, tire suas conclusões, repita isso de um dia para o outro, depois de uma semana, depois de um mês e por fim depois de um ano. Perceba que tudo sempre muda, nada é infinito, e é exatamente esta a beleza da vida, que cada coisa, por mais que pensemos que é imutável ou quase eterno, só dura efetivamente por um momento mínimo: o presente, pois a qualquer momento as coisas poder mudar, e abruptamente.
Exercício filosófico: análise espacial, análise temporal, análise comercial, análise estética, empatia, volta ao passado, percepção de pequenas mudanças e desgaste das coisas;
Efeito: mutabilidade, minimalismo, perspectiva morosa da mudança, degradação gradativa.
Segundo exercício: nosso dia a dia é muito corrido, sempre estamos com pressa, com horário, com metas, enfim, e por tudo isso, não paramos para apreciar o passar do tempo, use seu horário de almoço, faça sua refeição, e depois procure uma bela praça, arborizada, de preferência antiga, próximo a uma avenida movimentada com trafego considerável de pessoas, carros e ônibus. Sente-se, por este momento não pense no trabalho, na correria, no seu chefe, não pense em nada, esvazie sua mente, gradativamente, tenha um único objetivo, contemplar o céu, o movimento das árvores, ver o movimento frenético das pessoas, dos carros, do ônibus, do mundo, e você lá, parado, observando o caos da vida real de fora. Imagine o porquê da pressa de cada uma daquelas pessoas, pense em suas preocupações, anseios, objetivos e valores, perceba o quanto de tempo as pessoas estão perdendo, deixando a vida passar, simplesmente, por objetivos irreais ou valorosamente questionável, em contrapartida, observe os velhos da praça, sinta suas serenidades, paciências, imagine tudo os que ele já viveram, já viram, já sentiram, já perderam, e agora estão como você, apenas observando, vendo a vida passar, simplesmente, apreciando a estética da simplicidade, do pequeno, dos valores incalculáveis, do vôo dos pássaros, do movimento das nuvens, perceba o quanto não adianta somente correr, existe muita coisa pra ser vista, sentida, vivida, e muitas delas estão ao nosso redor diariamente, ali, somente nos esperando, mesmos que ignoradas, e quando percebidas nos presenteiam com sentimentos e percepções, e toda a beleza do presente.
Exercício filosófico: análise temporal, empatia, análise espacial, análise estética, perspectiva, meditação, perspectivas singulares;
Efeito: meditativo, imaginativo, analítico, minimalista, deslocamento e reclusivo.
Terceiro exercício: apesar de vivermos unicamente o presente, o passado e o futuro estão inseridos a todo o momento na nossa existência, fazemos tudo por influencia do passado ou pela perspectiva do futuro, sendo assim imagine-se sem passado, e sem futuro, imagine que o mundo que conhecemos foi criado de forma imediata, tudo já nasceu como é agora, tudo foi criado do meio, o este meio é o início, e o fim chegará em 10 dias. Este é o lapso temporal da existência deste mundo, 10 dias, 240 horas, 14.400 minutos entre o início e o fim. Neste mundo em que as coisas nasceram velhas, pense: o que você faria? Como viveria? Com quem se relacionaria? Quais valores teria? Seria como você é? Viveria como você vive? Quais seriam seus objetivos? Quais suas aventuras? A quem diria: eu te amo? Quem teria como amigos? Como trataria, veria e sentiria os seus semelhantes? E toda a vida que aflora no mundo? Quais valores e princípios teria? Qual o seu sentimento quando o fim estivesse próximo e não tivesse nada que pudesse ser feito, quais as coisas simplismente acabariam, tão inexplicavelmente como começaram?...
Exercício filosófico: análise temporal, temor, amplitude de valores, desapego material, inclusivo, meditação, elevação dos sentimentos,
Efeito: sentimental, reflexivo, perturbador, contemplativo, pacificador, extinção e finitude.
O ato da filosofia cotidiana, além de ser algo inerente ao nosso dia a dia, e a tudo que fazemos, pode também ser uma possibilidade de contemplação, introspecção, auto-analise, reflexão e meditação, qual podemos rever valores, adotar novos conceitos, ampliar nossos horizontes, enfim, um exercício de crescimento intelectual. Muitas vezes perdemos a oportunidade de contemplar a estética da simplicidade, de aprender com o cotidiano e valorizar as coisas pequenas, corriqueiras ou que estão ao nosso lado sempre, não perca mas esta oportunidade, aproveite, mude, filosofe!
REDAÇÃO
AFM

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